Estudo: homens não reconhecem o sexismo benevolente

A maioria das pessoas é capaz de reconhecer o sexismo em suas vidas diárias? E o que é preciso para fazê-las sacudir suas crenças sexistas?

Num estudo recente intitulado “Ver o invisível” as psicólogas Janet Swim da Pennsylvania State University e Julia Becker da Philipps University Marburg, na Alemanha, começaram a responder essas perguntas.

Ao longo de 7 dias e 3 testes distintos, Swim e Becker pediram a 120 universitários (82 mulheres e 38 homens, variando entre 18  e 26 anos de idade, alguns dos EUA e outros da Alemanha) que anotassem num diário, comentários sexistas que encontrassem em seu dia a dia. De acordo com Swim, ela e Becker esperavam determinar se forçando as pessoas a prestar atenção para as menos óbvias formas de sexismo, poderiam diminuir seu apoio a crenças sexistas.

Durante os testes, os indivíduos foram instruídos a observar casos de comportamento sexista próximo às mulheres que vão desde atenção sexual não desejada, piadas sexistas a comentários descaradamente depreciativos.

Foram também convidados a registrar ações mais sutis, que muitos consideram inofensivas: homens chamando mulheres de “garotas”, elogiando-as nos comportamentos tipicamente femininos e protegendo-as de tarefas mais “masculinas”. Swim e Becker descreveram para os participantes esses sexismos menos óbvios como “sexismo benevolente”, um termo criado pelos psicólogos Peter Glick e Susan Fisk num estudo em 1996 para se referir a “ uma atitude paternalista em relação às mulheres que idealiza-as afetivamente”, disse Glick ao The Huffington Post.

Em media, registraram dois termos depreciativos, dois comentários sexistas, 1,5 expressões de crenças negativas sobre as mulheres e 1,5 expressões que pareciam  positivas mas que de fato eram sexistas durante a semana. Swim lembrou de uma participante ter relatado que um estranho a abordou numa lavanderia e perguntou se ela poderia dobrar suas roupas e que por isso seria considerada “boazinha”.

Esse tipo de sexismo é “ambíguo”, disse Swim, e “as pessoas não sabem se eles estão brincando, então acabam ignorando um após o outro”.

Se você é instruído e confrontado por exemplos de sexismo, então começa a enxergar o invisível”, acrescentou.

A prevalência do sexismo _ benévolo ou hostil _ não era o foco principal do estudo, nem sua maior revelação. A descoberta mais significativa tem a ver em como as crenças dos homens e das mulheres mudaram depois que se conscientizaram de sua predominância. Além de pedir aos participantes para registrar ocorrências de sexismo, os pesquisadores também avaliaram o grau em que toleraram o comportamento sexista.

Depois de registrados os comportamentos sexistas, as pesquisadoras observaram que as mulheres eram mais propensas a considerar o comportamento menos aceitável. Os homens, por outro lado, continuaram a endossar o machismo, mesmo depois de se tornarem mais conscientes disso.

Porém, quando foi pedido para que demonstrassem empatia com as mulheres que são os alvos específicos dos incidentes sexistas, os homens foram menos propensos a sancionar o sexismo mais escancarado.

Num exemplo, os homens orientados a considerar os sentimentos das mulheres, foram menos propensos a achar que as mulheres reagem de forma exagerada ao responderem negativamente a um comportamento machista.

Quando se tratava de casos de sexismo benevolente,  porém, as atitudes dos homens não se alteraram. De acordo com Swim, os homens não consideraram declarações do tipo “uma boa mulher dever ser posta num pedestal” ou “em um desastre, as mulheres devem ser salvas antes dos homens”, como sexistas.

A pesquisa de Beck e Swim provocou indignação em alguns setores, apoiados por manchetes como essa do UK’s Daily Mail: “Homens que abrem portas para mulheres são SEXISTAS, não cavalheiros, afirmam feministas”. Focando as críticas nas pesquisadoras que pediram aos participantes que identificassem o aparente bem-intencionado comportamento masculino como discriminatório.

Anna Rittgers, uma blogueira do conservador Independent Women’s Forum, escreveu que primeiro achou que o estudo era uma farsa e que ela estava “começando a suspeitar que o movimento feminista moderno é constituído na verdade por um bando de genuínas misóginas, cujo objetivo é fazer com que as mulheres pareçam ridículas”.

O blog irlandês Joe.ie It’s Man Stuff escreveu sarcasticamente: “Bom trabalho senhoras, vamos garantir que bebam umas cervejas por isso, se apareceram para uma visita em Dublin. Mas vocês pagarão pelas cervejas, obviamente”.

A blogueira Mockarena, co-fundadora do blog Chicks on the Right, escreveu, “Eu não sei sobre vocês, mas é muito prejudicial para mim quando meu marido insiste em dirigir durante longas viagens de carro. Eu fico totalmente prejudicada psicologicamente quando ele diz que não vive sem mim. E me sinto profundamente discriminada quando tem a audácia de consertar os freios do meu carro”.

Mockarena disse mais tarde ao The Huffington Post que ela estava em “total descrença sobre o completo absurdo” do estudo.

“Claro que existem homens que podem ser completos machistas, que se comportam de forma inadequada e sem nenhuma consideração para os limites que uma mulher define”, ela disse. “Mas eu realmente acredito que se as mulheres não distinguem a diferença entre atos de pura consideração _como um marido ajudar a esposa a carregar os mantimentos _ e um indesejável beliscão na bunda, francamente, elas tem um problema.”

Glick, co-autor do estudo original sobre sexismo benevolente, disse temer que o sexismo benevolente tenha se tornado uma caricatura para a mídia e o público.

Nós não pensamos que os homens devem deixar de ser educados”, disse ele. “Muitas vezes o comportamento cavalheiresco é apropriado. O importante é saber quando se está cruzando a linha.”

“As próprias mulheres ignoram todo os tipos de sexismo e parte desse comportamento é um mecanismo de enfrentamento”, disse Swim. “Você quer viver a sua vida.”

Mas ignorar o sexismo tem conseqüências, ela disse. Muitas vezes a aceitação de formas mais sutis de sexismo, pode levar à aceitação de formas mais amplas de discriminação de gênero.

De acordo com Glick, o sexismo benevolente pode  de diversas maneiras, involuntariamente se transformar em sexismo hostil, quando uma mulher recusa assumir um papel pré-estabelecido. Ele usou o ambiente de trabalho como exemplo.

Se um homem se oferece para ajudar uma colega a configurar um computador do escritório, Glick disse, e ela aceita, é percebida como cordial, mas também como incompetente. Mas se ela recusa educadamente, muitas vezes é vista como uma “vadia”. Homens que aceitam ajuda são vistos como incompetentes, mas não sofrem a mesma discriminação se tentam fazer as tarefas sozinhos.

Então, para onde vamos a partir daqui?

“Mudar requer um debate sobre quando o sexismo benevolente deixa de ser ruim”, disse Swim  ao The Huffington Post. “Nem todas as mulheres pensam que é ruim, e isso diz respeito a se criar uma consciência cultural do que acontece quando as mulheres mantem a dependência e homens fazem coisas que não são tão obviamente sexistas.”

Nesse meio tempo, Swim considera “igualmente interessante” as pessoas serem capazes de desconsiderar o sexismo que elas experimentam em seu dia-a-dia “quando pensam se o sexismo é um problema ou não.”

In http://migre.me/9hysx

Tradução Arttêmia Arktos

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2 Comentários (+adicionar seu?)

  1. yume
    jun 04, 2012 @ 17:38:29

    entrevista sobre rivalidade feminina com feminista radical americana

  2. Yume
    jun 02, 2012 @ 15:02:56

    olha só que assustador( mas previsível):

    “Companhias farmacêuticas estão numa corrida para comercializar uma pílula para reavivar a libido feminina enfraquecida, sem sucesso; as mulheres não querem ser objetos sexuais, e uma cultura que objetifica as mulheres fará com que elas odeiem sexo, como escrevi nessa coluna cinco anos atrás. Mas o problema ficou pior que eu do que eu imaginava.”

    http://www.correiointernacional.com/archives/7739