“Escolha seu alvo, organize-se e comece a entrar em ação”, propõe líder feminista


Grupos feministas crescem no Reino Unido

Foram as revistas masculinas –com mulheres seminuas em poses sugestivas nas capas– expostas ao nível dos olhos na lojinha da esquina que provocaram a indignação de Isabella Woolford Diaz.

“Acho que eu não deveria ser obrigada a olhar para isso”, disse Diaz, 17. “É degradante. Se as pessoas querem comprar, que comprem, mas acho que alunos de 11 anos não deviam ser obrigados a olhar para isso.” Decidindo fazer algo de concreto, a estudante formou um grupo feminista na Escola Camden para Garotas, e em pouco tempo um grupo de base de 15 adolescentes, garotos e garotas, estavam tomando parte nas reuniões. “Eu estava muito frustrada com a maneira como as mulheres eram retratadas”, falou Diaz. “Me perguntei se estava apenas sendo chata. Mas não demorei a perceber que não era apenas eu que sentia isso.”

Hoje o grupo dela é uma entre dezenas de novas organizações feministas que vêm surgindo em vários pontos do Reino Unido, segundo o grupo de campanha UK Feminista. Pesquisas feitas para comemorar o segundo aniversário do grupo revelaram que o número de organizações feministas ativas de base dobrou nos últimos dois anos.

São feministas que não se enquadram facilmente nos moldes estereotípicos: são jovens e velhas, homens e mulheres, urbanoides e moradoras do campo. Está começando a surgir um novo tipo de feminista.

“São tempos realmente instigantes. Estamos assistindo a um ressurgimento real do ativismo feminista, que está passando das margens para o ‘mainstream'”, comentou Kat Banyard, fundadora do UK Feminista e autora de “The Equality Illusion” (A ilusão da igualdade).

“As pessoas estão se dispondo a erguer a mão e dizer que são feministas, sem medo de serem ridicularizadas. Especialmente nos últimos 12 meses, estamos vendo pessoas se assumindo publicamente como feministas.” Como os integrantes do grupo de Camden, muitas delas são jovens, entusiasmadas e não têm medo de empreender ações diretas.

Anna van Heeswijk, do grupo de campanha Object, falou sobre um grupo de alunos do ensino médio de uma escola urbana para a qual ela fez uma palestra sobre a objetificação sexual das mulheres.

Os alunos foram ao supermercado local para protestar contra a venda de revistas masculinas em posição que fica ao nível dos olhos dos fregueses. Eles foram armados com bandeiras, cornetas e slogans, e no mesmo dia o gerente do supermercado concordou em encomendar capas “de modéstia” para esconder as imagens sexualizadas de mulheres.

“Uma nova geração de mulheres jovens em todo o país está farta de ser sexualizada, objetificada e trivializada”, disse Heeswijk. “Existe poder real nas vozes destas jovens. Este é um bom momento para o ativismo feminista. A maré está virando.”

HOMEM TAMBÉM PODE?

Ativistas vêm questionando há décadas se homens podem ser feministas, mas agora, segundo militantes, homens estão engrossando as fileiras feministas.

Matt McCormack Evans, que fundou o Projeto Homens Antipornografia quando era estudante na Universidade Hull, acredita que mais homens gostariam de envolver-se na luta pela igualdade de gêneros e que mais mulheres estão dispostas a aceitá-los.

“As coisas vêm mudando realmente nos últimos anos, e hoje é muito mais aceitável que homens contestem as ideias tradicionais sobre a masculinidade”, disse. “Muitas feministas mais jovens querem que os homens se envolvam na luta e não têm tanto receio de que eles assumam o controle –ninguém quer ver um movimento feminista comandado por homens. Este é um movimento com metas e objetivos, não um clube com porteiros que decidem quem entra ou não.”

Novos grupos vêm pipocando mesmo em locais distantes. Ativistas feministas podem ser encontradas em praticamente todas as partes da Grã-Bretanha; até mesmo a Rede Feminista de Orkney tem 40 seguidores no Twitter. Michael Moore, o organizador regional do UK Feminista na Irlanda do Norte, disse que sites como Twitter e Facebook possibilitaram que pessoas que vivem mesmo nos pontos mais remotos do Reino Unido participem do debate.

“Hoje isso é fácil como enviar um e-mail para mobilizar pessoas. Não há pedidos de desculpas, não há minutas –as pessoas podem discutir questões imediatamente num espaço on-line. Isso realmente acelerou a capacidade de comunicação.”

“UAU!”

Discussões recentes sobre questões como a lei proposta por Nadine Dorries de tornar obrigatórias as aulas sobre abstinência sexual para garotas adolescentes e os temores suscitados pelo clima cada vez mais antiaborto no Reino Unido vêm colocando o feminismo na pauta da mídia outra vez. E eventos recentes de destaque, como uma série de “SlutWalks” (marchas das vadias) para protestar contra o tratamento dado a vítimas de estupro, vêm levando as feministas de volta às ruas.

Como disse Nina Mega, 17, de Edinburgh: “Às vezes você tem a impressão de que o mundo é um lugar bem misógino e que as feministas são poucas, mas quando você vê todas essas pessoas juntas, homens e mulheres, que pensam do mesmo modo, você diz ‘uau!’.”

De acordo com ativistas, as mulheres hoje enfrentam uma série de desafios que não eram vistos havia uma geração, e todas as ativistas feministas serão muito necessárias.

De acordo com a Fawcett Society, com duas vezes mais mulheres que homens previstas para perder seus empregos no setor público, as mulheres sendo as mais duramente atingidas pelos cortes nos serviços e benefícios e o receio de que, à medida que os serviços prestados pelo Estado se reduzem, as mulheres sejam obrigadas a preencher as brechas, existe o risco de que as conquistas árduas das mulheres em matéria de igualdade sexual sofram retrocessos.

“Estamos vivendo um momento decisivo para os direitos das mulheres”, disse Anna Bird, executiva-chefe da Fawcett Society. “As mulheres estão sentindo o peso maior das demissões e dos cortes de gastos. Ao invés de ver avanços nos direitos das mulheres, é possível que vejamos a disparidade salarial entre homens e mulheres aumentar. Não podemos ser complacentes, e acho que cada vez mais mulheres têm consciência disso.”

In Jornal Floripa

“Escolha seu alvo, organize-se e comece a entrar em ação”, propõe líder feminista

O “Guardian” entrevistou Kat Banyard, fundadora do grupo UK Feminista

Leia, abaixo, a entrevista.

“GUARDIAN” – Por que o feminismo é uma “revolução inacabada”?

KAT BANYARD –  As mulheres fizeram avanços enormes, mas muitos direitos legais, como a igualdade salarial, ainda não se concretizaram em realidades. Há uma mulher para cada quatro homens no Parlamento, as mulheres que trabalham em período integral ganham em média 15% menos que os homens, e dois terços dos trabalhadores que recebem salários baixos são mulheres. Conquistas arduamente ganhas, como o direito ao aborto legal e seguro, estão sendo atacadas. E novas manifestações de sexismo, como a indústria sexual global, vêm colocando o progresso em marcha a ré.

De que modo os protestos de hoje são diferentes da primeira onda de feminismo?

Está claro que alguns aspectos mudaram. Tome-se a tecnologia: os avanços na tecnologia de comunicações significam que hoje as redes sociais são ferramentas chaves de mobilização, e as feministas podem reportar e divulgar imagens de seus protestos instantaneamente. Ou tome-se o caso da economia: três décadas de neoliberalismo levaram os alvos de protestos a seguir o deslocamento do poder das mãos do governo para as de particulares. Mas os aspectos fundamentais do ativismo feminista continuam os mesmos: a luta contra o privilégio e a busca do lucro, desde o quarto de dormir até os conselhos de direção de empresas. E, como sempre, a promessa do feminismo é um mundo que será melhor para todos.

Como jovens feministas principiantes podem iniciar sua própria “revolução”?

Quer se trate do sexismo de tipo tóxico de Hugh Hefner, da solução fajuta à falta de confiança corporal das mulheres proposta pelo ás da cirurgiã plástica Mel Braham ou, ainda, os cortes na independência financeira das mulheres feitos pela coalizão governista, você tem o poder de enfrentar essas questões. Seja você quem for, esteja onde estiver, há algo que você pode fazer. Portanto, escolha seu alvo, organize-se e comece a entrar em ação.

In Jornal Floripa

Textos relacionados:

A transformação do silêncio em linguagem e ação

Vista seu protesto em uma camiseta


Feminismo, ontem e hoje


Depois de relevantes conquistas e com novos desafios pela frente, quais os rumos do feminismo hoje? Para relembrar a trajetória do movimento brasileiro desde os anos 1970 e discutir o seu papel nos dias atuais, o Feminino conversou com mulheres ligadas ao tema. Uma delas, a antropóloga e socióloga Lia Zanotta Machado, autora do livro Feminismo em Movimento (Editora Francis), fez um balanço dos momentos decisivos no Brasil. Aqui, por causa da ditadura, afirma Lia, a luta foi politicamente mais de esquerda do que as campanhas francesa e americana (consideradas mais liberais ):

– Em 1975 houve, no Rio de Janeiro, o Seminário sobre o Papel e o Comportamento da Mulher na Sociedade Brasileira. Foi o primeiro ato público em que as questões principais eram a condição da mulher no País, o trabalho, a saúde física e mental, a discriminação racial e a homossexualidade feminina, além do posicionamento a favor da democracia. Dois anos depois, foi aprovada a emenda do senador Nelson Carneiro, instituindo o divórcio. Foi uma espera de 27 anos.

Lia relembra, ainda, a forte repercussão, em 1976, do assassinato da milionária Ângela Diniz, praticado por seu namorado, Doca Street. Num primeiro julgamento, em 1979, ele foi inocentado sob o argumento de “legítima defesa da honra”. Um ano depois, porém, após entrar no fórum sob vaias de feministas, foi condenado a 15 anos de prisão. O caso se tornou símbolo de uma virada histórica.

Anos depois, surgiram os grupos de SOS, com serviços de atendimento às mulheres vítimas da violência. “Seria a semente da criação, em 85, das Delegacias Especializadas das Mulheres, uma invenção brasileira cujo modelo foi copiado por países da América Latina”, diz Lia.

A década de 80 foi fundamental, ainda, na luta das brasileiras em relação à saúde. Segundo a antropóloga, as propostas do Estado quanto ao controle de natalidade e à esterilização das mulheres sem acesso à informação recebiam duras críticas. Em resposta, movimentos feministas e profissionais da área médica propuseram o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM) – um contraponto ao então atendimento quase exclusivo da mulher como mãe.

No período pré-Constituição, o CNDM articulou, junto com os conselhos estaduais e municipais e a Bancada Feminina no Congresso, estratégias que visavam a inclusão dos direitos humanos das mulheres na Constituição de 1988. A campanha “Constituinte para valer tem que ter palavra de mulher” e o lobby do batom resultaram na “Carta das Mulheres aos Constituintes”. Em 1988, a nova Constituição incorporou a maioria das reivindicações.
Antes da promulgação da Lei Maria da Penha, em 2006, a agressão doméstica era considerada uma violência contra os costumes e não contra a pessoa. “Com a lei, o homem que é denunciado deixa de ser réu primário”, comenta Lia.

Entre os desafios atuais do movimento está a questão do aborto. “Existe um pensamento comum, nas classes média e baixa, de que quando se trata de uma pessoa próxima e cujas razões são conhecidas, o aborto é aceito. Mas é preciso pensar nas demais mulheres que, por circunstâncias afetivas, sociais e econômicas, não podem levar a gestação adiante”, pondera a antropóloga.
Outra discussão é a participação das mulheres na política. Segundo a organização internacional União Interparlamentar, num ranking de 188 nações, o Brasil ocupa o 104º lugar em relação à presença feminina nos parlamentos. “Nesse âmbito, o fato histórico de termos uma mulher na presidência e mais ministras produz um efeito de desnaturalização do espaço masculino no poder”, diz Lia.

A conclusão da estudiosa é que ainda há muito a fazer. “Um dos caminhos para promover profundas mudanças seria intensificar os debates sobre gênero e raça nas escolas, o que é feito hoje de forma periférica, através de livros paradidáticos.”

Seriam as mulheres do campo mais organizadas do que as dos centros urbanos? Segundo a psicóloga Nalu Faria, coordenadora geral da Sempreviva Organização Feminista (SOF) e integrante da Secretaria Nacional da Marcha Mundial das Mulheres, realmente as trabalhadoras rurais constroem grandes articulações. “Mas há pontos de união em comum, como o trabalho, a soberania alimentar, a violência e a saúde.”

Contraste. Por outro lado, um abismo divide as mulheres: na base estão as mais pobres e, no topo, as que ganham altos salários. “O acesso aos direitos não chegou a todas as camadas. No Brasil, as mulheres são as mais pobres, em particular as negras e rurais. Temos só 52 mulheres em cada 100 que estão no trabalho assalariado. Um dos pilares da Marcha é a luta por um salário mínimo mais digno, que impacte de forma positiva a vida dessas mulheres”, afirma Nalu.

A violência, pauta do movimento desde os primórdios, ainda é um problema grave. “A cada 15 segundos, uma mulher é vítima de agressão no Brasil. Embora a Lei Maria da Penha tenha tornado o tema mais público, é importante trabalhar no âmbito da prevenção”, afirma a psicóloga. “A violência, fruto da relação de poder, não acontece de uma hora para outra. Começa com o controle, o isolamento e a desqualificação da mulher, que se sente fragilizada, com baixa autoestima e economicamente dependente.”
Nalu também destaca a questão do aborto. Apesar da criminalização no Código Penal, um número estimado de 1 milhão de procedimentos do tipo ocorrem anualmente no País. “O aborto inseguro é a terceira causa de morte materna. Somos a favor da descriminalização e legalização do aborto, mas é importante criar condições de a mulher não chegar até ele.”

Outra plataforma forte da Marcha, explica Nalu, é o posicionamento contra a mercantilização do corpo feminino. O movimento rechaça a prostituição e o uso do corpo como um produto, ao considerar os sistemas de aliciamento da indústria da prostituição cada vez mais poderosos no turismo sexual e no tráfico de mulheres.

In http://migre.me/40eI4

8 de março, dispensamos a rosa. Preferimos respeito e igualdade!


Este texto mostra a tentativa de tornar a data de luta e reivindicação das mulheres num evento inócuo e que não espelha nem um pouco o seu real significado. Publico porque tudo o que está aqui é a mais pura verdade.

No dia 8 de março, dispense a rosa.


Marjorie Rodrigues

Dia 8 de março seria um dia como qualquer outro, não fosse pela rosa e os parabéns. Toda mulher sabe como é. Ao chegar ao trabalho e dar bom dia aos colegas, algum deles vai soltar: “parabéns”.

Por alguns segundos, a gente tenta entender por que raios estamos recebendo parabéns se não é nosso aniversário (exceção, claro, à minoria que, de fato, faz aniversário neste dia). Depois de ficar com cara de bestas, num estalo a gente se lembra da data, dá um sorriso amarelo e responde “obrigada”, pensando: “mas por que eu deveria receber parabéns por ser mulher?”.

Mais tarde, chega um funcionário distribuindo rosas. Novamente, sorriso amarelo e obrigada. É assim todos os anos. Quando não é no trabalho, é em alguma loja. Quando não é numa loja, é no supermercado. Todos os anos, todo 8 de março: é sempre a maldita rosa.

Dizem que a rosa simboliza a “feminilidade”, a delicadeza. É a mesma metáfora que usam para coibir nossa sexualidade – da supervalorização da virgindidade é que saiu o verbo “deflorar” (como se o homem, ao romper o hímen de uma mulher, arrancasse a flor do solo, tomando-a para si e condenando-a – afinal, depois de arrancada da terra, a flor está fadada à morte). É da metáfora da flor, portanto, que vem a idéia de que mulheres sexualmente ativas são “putas”, inferiores, menos respeitáveis.

A delicadeza da flor também é sua fraqueza. Qualquer movimento mais brusco lhe arranca as pétalas. Dizem o mesmo de nós: que somos o “sexo frágil” e que, por isso, devemos ser protegidas. Mas protegidas do quê? De quem? A julgar pelo número de estupros, precisamos de proteção contra os homens. Ah, mas os homens que estupram são psicopatas, dizem. São loucos. Não é com estes homens que nós namoramos e casamos, não é a eles que confiamos a tarefa de nos proteger. Mas, bem, segundo pesquisa Ibope/Instituto Patricia Galvão, 51% dos brasileiros dizem conhecer alguma mulher que é agredida por seu parceiro. No resto do mundo, em 40 a 70 por cento dos assassinatos de mulheres, o autor é o próprio marido ou companheiro.Este tipo de crime também aparece com frequência na mídia. No entanto, são tratados como crimes “passionais” – o que dá a errônea impressão de que homens e mulheres os cometem com a mesma frequência, já que a paixão é algo que acomete ambos os sexos. Tratam os homens autores destes crimes como “românticos” exagerados, príncipes encantados que foram longe demais. No entanto, são as mulheres as neuróticas nos filmes e novelas. São elas que “amam demais”, não os homens.

Mas a rosa também tem espinhos, o que a torna ainda mais simbólica dos mitos que o patriarcado atribuiu às mulheres. Somos ardilosas, traiçoeiras, manipuladoras, castradoras. Nós é que fomos nos meter com a serpente e tiramos o pobre Adão do paraíso (como se Eva lhe tivesse enfiado a maçã goela abaixo, como se ele não a tivesse comido de livre e espontânea vontade). Várias culturas têm a lenda da vagina dentata. Em Hollywood, as mulheres usam a “sedução” para prejudicar os homens e conseguir o que querem. Nos intervalos do canal Sony, os machos são de “respeito” e as mulheres têm “mentes perigosas”. A mensagem subliminar é: “cuidado, meninos, as mulheres são o capeta disfarçado”. E, foi com medo do capeta que a sociedade, ao longo dos séculos, prendeu as mulheres dentro de casa. Como se isso não fosse suficiente, limitaram seus movimentos com espartilhos, sapatos minúsculos (na China), saltos altos. Impediram-na que estudasse, que trabalhasse, que tivesse vida própria. Ela era uma propriedade do pai, depois do marido. Tinha sempre de estar sob a tutela de alguém, senão sua “mente perigosa” causaria coisas terríveis.

Mas dizem que a rosa serve para mostrar que, hoje, nos valorizam. Hoje, sim. Vivemos num mundo “pós-feminista” afinal. Todas essas discriminações acabaram! As mulheres votam e trabalham! Não há mais nada para conquistar! Será mesmo? Nos últimos anos, as diferenças salariais entre homens e mulheres (que seguem as mesmas profissões) têm crescido no Brasil, em vez de diminuir. Nos centros urbanos, onde a estrutura ocupacional é mais complexa, a disparidade tende a ser pior. Considerando que recebo menos para desempenhar o mesmo serviço, não parece irônico que o meu colega de trabalho me dê os parabéns por ser mulher?

Dizem que a rosa é um sinal de reconhecimento das nossas capacidades. Mas, no ranking de igualdade política do Fórum Econômico Mundial de 2008, o Brasil está em 10oº lugar entre 130 países. As mulheres têm 11% dos cargos ministeriais e 9% dos assentos no Congresso – onde, das 513 cadeiras, apenas 46 são ocupadas por elas. Do total de prefeitos eleitos no ano passado, apenas 9,08% são mulheres. E nós somos 52% da população.

A rosa também simboliza beleza. Ah, o sexo belo. Mas é só passar em frente a uma banca de revistas para descobrir que é exatamente o contrário. Você nunca está bonita o suficiente, bobinha. Não pode ser feliz enquanto não emagrecer. Não pode envelhecer. Não pode ter celulite (embora até bebês tenham furinhos na bunda). Você só terá valor quando for igual a uma modelo de 18 anos (as modelos têm 17 ou 18 anos até quando a propaganda é de creme rejuvenescedor…). Mas mesmo ela não é perfeita: tem de ser photoshopada. Sua pele é alterada a ponto de parecer de plástico: ela não tem espinhas nem estrias nem olheiras nem cicatrizes nem hematomas, nenhuma dessas coisas que a gente tem quando vive. Ela sorri, mas não tem linhas ao lado da boca. Faz cara de brava, mas sua testa não se franze. É magérrima (às vezes, anoréxica), mas não tem nenhum osso saltando. É a beleza impossível, mas você deve persegui-la mesmo assim, se quiser ser “feminina”. Porque, sim, feminilidade é isso: é “se cuidar”. Você não pode relaxar. Não pode se abandonar (em inglês, a expressão usada é exatamente esta: “let yourself go”). Usar uma porrada de cosméticos e fazer plásticas é a maneira (a única maneira, segundo os publicitários) de mostrar a si mesma e aos outros que você se ama. “Você se ama? Então corrija-se”. Por mais contraditória que pareça, é esta a mensagem.

Todo dia 8 de março, nos dão uma rosa como sinal de respeito. No entanto, a misoginia está em toda parte. Os anúncios e ensaios de moda glamurizam a violência contra a mulher. Nas propagandas de cerveja e programas humorísticos, as mulheres são bundas ambulantes, meros objetos sexuais. A pornografia mainstream (feita pela Hollywood pornô, uma indústira multibilionária) tem cada vez mais cenas de violência, estupro e simulação de atos sexuais feitos contra a vontade da mulher. Nos videogames, ganha pontos quem atropelar prostitutas.

Todo dia 8 de março, volto para casa e vejo um monte de mulheres com rosas vermelhas na mão, no metrô. É um sinal de cavalheirismo, dizem. Mas, no mesmo metrô, muitas mulheres são encoxadas todos os dias. Tanto que o Rio criou um vagão exclusivo para as mulheres, para que elas fujam de quem as assedia. Pois é, eles não punem os responsáveis. Acham difícil. Preferem isolar as vítimas. Enquanto não combatermos a idéia de que as mulheres que andam sozinhas por aí são “convidativas”, propriedade pública, isso nunca vai deixar de existir. Enquanto acharem que cantar uma mulher na rua é elogio , isso nunca vai deixar de existir. Atualmente, a propaganda da NET mostra um pinguim (?) dizendo “ê lá em casa” para uma enfermeira. Em outro comercial, o russo garoto-propaganda puxa três mulheres para perto de si, para que os telespectadores entendam que o “combo” da NET engloba três serviços. Aparentemente, temos de rir disso. Aparentemente, isso ajuda a vender TV por assinatura. Muito provavelmente, os publicitários criadores desta peça não sabem o que é andar pela rua sem ser interrompida por um completo desconhecido ameaçando “chupá-la todinha”.

Então, dá licença, mas eu dispenso esta rosa. Não preciso dela. Não a aceito. Não me sinto elogiada com ela. Não quero rosas. Eu quero igualdade de salários, mais representação política, mais respeito, menos violência e menos amarras. Eu quero, de fato, ser igual na sociedade. Eu quero, de fato, caminhar em direção a um mundo em que o feminismo não seja mais necessário.

…Enquanto isso não acontecer, meu querido, enfia esta rosa no dignissímo senhor seu cu.

http://pixelporpixel.wordpress.com/2009/03/04/hello-world/